CIPA - COMISSÃO INTERNA DE PREVENÇÃO DE ACIDENTES
NOVAS PERSPECTIVAS EM INVESTIGAÇÃO DE ACIDENTES
É supreendente que muitas pessoas não conseguem contar sequer o número de situações que por um triz poderiam tê-las matado.
A maioria das investigações de acidente/incidentes tendem a olhar a lesão ou o acidente de uma perspectiva externa. Em outras palavras, alguém (tipicamente) investiga o acidente ou a lesão em vez da pessoa que sofreu o acidente ela mesma fazer a investigação. Obviamente, em caso de lesões graves ou fatais, isso faz sentido, porque seria impossível fazer uma investigação de um leito de hospital ou do IML.
Mas em outros casos em que a pessoa não foi seriamente lesionada continua sendo muito mais comum que uma outra pessoa faça a investigação. Porque? Bem, de novo algumas explicações óbvias vem à mente: “nós temos que ser imparciais, nós queremos que isso tenha credibilidade, somente pessoas bem treinadas e capacitadas são competentes” e por aí vai…
Entretanto, se o propósito da investigação não é estabelecer uma culpa (pelo menos é o que todo mundo diz) mas somente para prevenir que a mesma coisa não aconteça de novo, porque é que pessoas altamente treinadas, capacitadas e competentes que investigam acidentes - em alguns casos centenas de acidentes – não possam fazê-lo por si próprias quando elas sofrem um acidente?
Por exemplo, anos atrás eu fui a um seminário em investigação de incidente/acidente empreendida por um das companhias mais seguras do mundo. Um dos instrutores tinha na testa uma pequena cicatriz do tamanho de um moeda. Como ele não tinha muito cabelo, dava pra notar bem a cicatriz. Ele tinha investigado muitas lesões e acidentes na sua carreira antes de ele se tornar um líder em seminários.
Durante o coffe break, eu perguntei a ele o que havia acontecido. Ele disse, “Eu sei, eu sei, isto é um pouco embaraçoso… eu estava fazendo algumas conexões elétricas no meu andar e aí eu me levantei muito rápido”.
“E o que é que o atingiu?”, eu perguntei;
“Foi uma viga de madeira”.
“Mas havia alguma lasca pra fora ou algum corte na madeira?”, eu perguntei.
Ele disse “não, eu me esqueci onde eu estava e me levantei sem sequer pensar que havia um teto rebaixado”.
“E aí, o que você vai fazer para prevenir que algo semelhante possa acontecer de novo?” eu perguntei.
“Eu terei que ser mais cuidadoso, da próxima vez eu vou tentar dar mais atenção onde é que eu estou”.
Ironicamente, “dizer ao empregado para ser mais cuidadoso” ou “dizer ao empregado para prestar mais atenção da próxima vez”, não fazia parte do Seminário.
Ainda mais irônico, pelo menos na minha opinião, é que os profissionais e consultores nunca – nem que tenha sido uma vez nas suas carreiras – tenham usado a palavra “falta de cuidado” em uma investigação de acidente ou incidente, embora eles tenham dito a seus filhos, literalmente centenas de vezes para “terem cuidado”. Eles sabem que culpar o trabalhador por estar tendo falta de cuidado, indica uma técnica ultrapassada e não funciona. Mas para as pessoas que eles mais amam, eles tem dito “tenha cuidado” literalmente centenas e centenas de vezes.
Uma vez eu perguntei a um grupo de diretores de segurança de uma corporação se eles sabiam o que é a “causa raiz” de uma investigação de acidente. Como você pode imaginar, todos eles levantaram as mãos.
“Quantos de vocês tem pensado nisso?”, eu perguntei. De novo, quase todos fizeram o mesmo. Alguns deles pareciam me dizer “você tá começando a ficar chato”.
Então eu perguntei a eles: “quantos de vocês já tiveram um dedo atingido por uma porta de carro?” quase a metade deles levantaram as mãos (o que ocorre em quase qualquer grupo de pessoas). “E então, quantos de vocês fizeram uma investigação da “causa raiz” do acidente?, eu perguntei. Ninguem colocou as mãos para cima. “Porque não?”, eu perguntei. Um cara olhou pra mim e disse: “Por que eu iria fazer isso? foi só um erro estúpido”.
Afinal, com alguma sorte, “tentar não cometer outro erro estúpido” não tenha sido uma de suas recomendações quando ele investigava lesões em ambientes de trabalho.
Falando sério, porque isso é tão diferente quando estamos investigando lesões que ocorrem com outras pessoas? Porque nós não damos conselhos a nós mesmos do que damos para outras pessoas?. Se agente pensa que este processo vale a pena, porque que é que não o fazemos com nós mesmos? Você já se pôs a investigar algumas de suas próprias lesões? (se você não tem, você é uma exceção, não a regra).
POR UM MOMENTO, ESQUEÇA O MODELO TRADICIONAL, talvez porque não temos o modelo certo para trabalhar com ele. Talvez porque não estamos ouvindo a nós mesmos. Talvez porque nós aceitamos as lições daqueles que estão próximos de forma muito literal. Ou talvez porque não estamos olhando as causas de acidentes de perspectivas as mais diversas possíveis.
Ou seja, embora isto possa ser aborrecido, vamos voltar ao mais básico: para ocorrer um incidente você precisa de alguma forma de energia geradora de riscos e alguma coisa não planejada ou inesperada que possa ocorrer. Para ocorrer uma lesão, você precisa que uma energia geradora de riscos possa ter contato com uma pessoa ou a pessoa ter contato com ele;
Tradicionalmente o foco tem sido na fonte da energia geradora de riscos e assim manter essa energia longe do contato com a pessoa através de controles de engenharia, regras, procedimentos e equipamentos de proteção individual.
Entretanto, como todo mundo sabe, há limites em termos do que você pode conseguir com regras, procedimentos, EPI e controles de engenharia.
Isso não quer dizer que a eficiência dessas salvaguardas deve ser ignorada ou subestimada, porque (obviamente) se você pode eliminar o risco, você não minimiza, você elimina o risco!.
Mas talvez pode ser mais esclarecedor dar uma olhada na fonte de alguma coisa inesperada ocorrendo. Porque se você pensa sobre isso, existem somente três fontes de inesperado: ou você faz alguma coisa inesperada, ou outro cara faz alguma coisa inesperada, ou o equipamento faz alguma coisa inesperada. Vai ser uma dessas três ou a combinação deles, a não ser, é claro, algum ato divino.
São esses problemas que aparecem quando alguem procede a uma investigação. É impossível para o “investigador externo” saber exatamente o que estava acontecendo, ou o que se passava na cabeça da pessoa no momento em que ele se feriu. Dessa forma nós temos que nos basear no que a pessoa lesionada nos diz. Entretanto, poucas pessoas irão deliberadamente tentar incriminar elas mesmas e assim elas podem não nos dizer em que elas estavam pensando ou o que estavam fazendo naquele momento. Se você aceita o que eles dizem cara a cara, então é provável – especialmente após dezenas e dezenas de investigação – haver uma distorção de sua perspectiva sobre o que as pessoas realmente estão fazendo para se acidentaram, especialmente em termos de pequenos acidentes.
Mas (se você é o acidentado) você sabe o que estava ocorrendo ou não ocorrendo, em sua própria cabeça, naquele momento. Em vez de ficar pensando sobre como outras pessoas se acidentam, pense como você tenha se acidentado.
CONSTRUINDO SUA PRÓPRIA PIRÂMIDE DE RISCO
Obs. do Blog: Frank Bird apresentou um modelo piramidal para representar a evolução dos incidentes para os acidentes com graves danos humanos.
VOCÊ E SEUS ACIDENTES
Quantas lesões sérias você sofreu até agora, na sua vida? Quantos ossos quebrados, ruptura de ligamentos, queimaduras de terceiro grau, você já teve? A maioria das pessoas, se tem entre 30 e 50 anos e se eles somarem os de trabalho, fora de trabalho, dirigindo carros ou motos, esportes - já passaram entre 1 a 5 lesões maiores.
E sobre os acidentes menores, tipo com agulhas, torções, e pequenas lesões musculares? Mais uma vez, a maioria das pessoas entre 30 e 50 anos tem passado entre 5 a 10 desses tipos de acidentes.
É aqui que começa a ficar engraçado. Se você for descendo um ou mais do nível da antiga pirâmide de risco, quantos cortes, contusões e arranhões você já teve ao longo da sua vida?
UM MONTE DE ACIDENTES
Bem, a resposta mais comum é “um monte”. Mas quando você pergunta às pessoas (e eu já perguntei a cerca de 45.000 pessoas, e assim eu não estou dizendo que isso é definitivo) se “um monte” é centenas ou milhares; se eles pensam nos primeiros 20 anos de idade ou se você pede pra eles pensarem nos seus próprios filhos – eles concluem que “um monte” é milhares (com provavelmente 3.000 a 5.000 que eles nem se lembram sequer, porque eles aconteceram quando eles tinham menos de 6 anos de idade).
E ainda a categoria mais significativa de todos é aquela na base da pirâmide. Quantas situações “por um triz” que você já passou? Quantas vezes você teve que pisar no freio justamente para evitar rapidamente atingir um veículo, caminhão, ou pedestre? Quantas vezes você teve que girar o volante (ou o guidon da moto) para evitar bater o veículo? Quantas vezes você quase cai e tem que recuperar o equilíbrio sem cair? (muitas pessoas, eu inclusive, não se lembra de quantas vezes caiu, sem considerar as vezes do “quase caiu”). E quantas vezes outra pessoa teve que apertar o freio ou girar o volante rapidamente para evitar bater em você e não teve tempo de buzinar?.
Portanto, é impossível para qualquer um contar de forma exata o número de situações “por um triz” que já passou. Mas, surpreendentemente, muitas pessoas não conseguem sequer contar o número de situações “por um triz” que poderiam tê-las matado.E isso é especialmente verdadeiro se você pega as pessoas para pensar no número de vezes que eles adormecem ou quase adormecem enquanto estão dirigindo. Estima-se que entre 13 a 20% de todos os acidentes fatais de veículos são causados por pessoas que adormecem ao volante.
SITUAÇÕES “POR UM TRIZ”
Se você pegar as pessoas para olhar ou construir sua própria pirâmide pessoal de risco, a maioria, se não todos nós, já sofreu mais lesões e situações por um triz do que o número de lesões e investigações de acidente que já fizemos ou vamos fazer. E de uma certa maneira, são dados mais confiáveis porque nós sabemos o que estávamos pensando ou não no momento quando a gente se feriu.
Agora, após construirmos nossa própria pirâmide de risco, pergunte a você mesmo, “qual foi a fonte do inesperado?” em cada uma dessas lesões. O que você irá provavelmente encontrar é que mais de 90% de suas próprias lesões a coisa inesperada que entrou na equação não foi o equipamento ou outra pessoa.
Se você tiver uma centena de pessoas em uma sala (para um simples cálculo) e perguntar a eles para pensar somente sobre as lesões sérias (por exemplo, cortes ou pior) e depois perguntá-las quantas delas tiveram “lesões graves” em termos de terem acontecido de forma rápida ou aguda porque o carro que eles estavam dirigindo ou o equipamento que eles estavam trabalhando deu pane ou apareceu alguma coisa inesperada. Provavelmente 2 de 5 pessoas vão levantar as mãos. Se você então perguntá-las quantas vezes foram lesionadas devido a que outra pessoa tenha feito algo inesperado? Você vai ter provavelmente 10 a 15 mãos para cima, embora muitas pessoas irão contar apenas um exemplo.
Para a maioria das 90% das lesões ocorre no próprio corpo. Entretanto, se você incluir cortes, contusões, choques e arranhões, mais de 99% das lesões agudas ocorrem no próprio corpo.
Em outras palavras, com exceção de um número percentual muito pequeno, as pessoas ferem elas próprias. Não é o equipamento ou outra pessoa. Nós fazemos alguma coisa a nós, inesperadamente, para causar a lesão, não importa se você está no trabalho, fora dele ou dirigindo o seu carro.
Preste atenção em todos os fatoresPortanto, onde isso nos levará? Devemos dizer a outras pessoas a mesma coisa que dizemos aos nossos filhos: “Você precisa ser mais cauteloso”. NÃO. Isto é metodologia antiga e não vai funcionar. O que precisamos fazer é fazê-los entender como todos os fatores envolvidos em um incidente ou acidente são importantes (não apenas o que nos disseram em uma investigação).
Por exemplo, você está estressado ou frustrado ou excessivamente cansado? Será que você tem sido muito complacente com o trabalho, a tarefa ou riscos de forma que você não pensou no risco quando você sofreu uma lesão?
Será que algum desses estados ou fatores humanos fez com que você cometesse erros ou um erro crítico, como por exemplo, não estar com os olhos e a mente não focados no trabalho, movendo-se ou estando na linha de fogo ou de alguma forma perdendo seu equilíbrio, tração ou capacidade de segurar?
Mais de 90 por cento de todas as lesões em qualquer lugar – no trabalho, fora do trabalho ou na rua – são causados por esses padrões de risco de erros.
Uma vez que você tenha explanado a “mecânica” em como pessoas se acidentam, então será fácil o suficiente para explicar o que pode ser feito e o que eles podem fazer por elas mesmas, além de “tentar ser mais cuidadosa”. Primeiro de tudo, você pode ensiná-los a procurar se darem conta quando eles estão stressados, frustrados, cansados ou complacentes, eles estarão mais predispostos a cometer um dos quatro erros críticos.
Se eles puderem reconhecer quando eles estão stressados, frustrados ou cansados, e assim pensar sobre seus olhos na tarefa, sua mente na tarefa, na linha de fogo, no equilíbrio, tração ou capacidade de segurar, isto será suficiente para evitar um desses erros. Em outros palavras, ficar antenado no estado imediatamente anterior ao que cometeu o erro.
Se eles não estão estressados, cansados ou frustrados, eles podem ter ficado complacentes. Complacência pode facilmente levar a mente para longe da tarefa. A mente que não esteja focada na tarefa, pode levar até à linha de fogo, levar a que os olhos fiquem desfocados da tarefa e assim ficar tambem fora de equilíbrio.
Complacência não é uma coisa fácil de destacar até considerar a situação “após o fato”. Entretanto, é facil o suficiente para identificar trabalho ou tarefas onde alguem está predisposto a se tornar complacente (como estar dirigindo) e assim levar a pessoa a trabalhar de acordo com seus hábitos. Mesmo quando a sua mente entra em devaneio, (complacência) eles ainda mantem os seus olhos na estrada.
Outros hábitos, como apertar um corrimão, testar a firmeza do pé quando se sai do carro e olhar em volta antes de se mover irá reduzir o risco de acidente para outros trabalhos e tarefas quando a complacência possa se tornar um fator.
COMPORTAMENTOS DE SEGURANÇA
Assim, quando você estiver investigando incidente ou acidente, veja se você consiga que o empregado diga a você qual o estado mental em que eles poderiam estar quando ocorreu o acidente. Se eles estavam estressados, frustrados ou cansados, fale para eles sobre a técnica de “estar antenado”. Se eles estiverem complacentes, veja se eles podem trabalhar dentro dos seus hábitos e assim quando a sua mente se desviar da tarefa eles irão adotar um comportamento de segurança automaticamente.
Você pode até querer que eles saibam quão importante pode ser a observação desses padrões de risco para erros (cada vez que você fizer isso automaticamente), fará você mais atento para a sua própria segurança e ajudará você a lutar contra o fator da complacência.
Finalmente, ensine-os a fazer essa mesma análise para eles mesmos, mesmo quando se tratar de um pequeno acidente ou uma situação “por um triz”. Deste modo, eles podem aprender de todos os seus pequenos acidentes, não apenas aqueles mais sérios. Apesar de tudo, todos nós já sofremos lesões milhares de vezes. Se nós pudermos aprender um pouco de cada um, em vez de descrevê-lo como “apenas mais um erro estúpido”, todos poderemos ser bem melhores.
Mas não diga, mesmo para os seus filhos, “tente ficar mais alerta”, ou “tente dar mais atenção na próxima vez”, ou (escolha esse) “tente estar mais consciente de sua situação da próxima vez”. Você deve tambem dizer: “tente ser mais cuidadoso”. Em vez disso, ensine-lhes o que eles realmente precisam fazer para prevenir a próxima lesão:
1. Ficar antenado e assim você não comete erros;
2. Trabalhar em melhorar seus hábitos;
3. Observar outros sobre os padrões de risco de erros que aumentam a possibilidade de acidente (uma vez que você reconhecê-los, você irá vê-los em qualquer lugar)
4. Analise as situações “por um triz” e os pequenos erros; aprenda com eles e você proavalmente não vai agonizar quando acontecer um acidente grave.
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